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UMA INVERSÃO TÉRMICA DO ANO PASSADO

Dada a  minha desesperação pelo silêncio dos meus colegas de blog, a indiferencia dos escassos leitores que não fazem o mais triste comentário nem apertam o “eu gosto disto”  nem não gostam, nada. Isto é  o deserto, o lhaneiro solitário sem o seu cavalo Silver “Hi-yo, Silver, away”, uma piscina vazia em inverno, uma folha seca e pisada de outono, uma alergia de primavera, o sufoco de verão. Por isto e porque não sei de que porra escrever para ninguém, sim, já sei que copio e pasto um bocadinho, que há apatia na escrita, nos artigos, sei que tenho menos interesse que os quartos de final da OTI e menos luzes que o camarim de Stevie Wonder, eu sei, eu sei, pois é, a seguir com a linha de actuação que tantos sucessos me deu, e como vingança contra a Coisa nenhuma, o não-ser, aqui deixo um poemilha dedicado a uma inversao térmica do outono de 2012 que assim mesmo, dediquei ao meu parceiro Machimbombo, amigo dos fenómenos climáticos e que nesses dias me falou daquela inversão. Que castigo trás castigo!… eu sei.

INVERSÃO TÉRMICA 2012

Viajou pelas subtis camadas de ar

Por adiabáticos impenetráveis, mergulhou

Ventos calmos, céu claro e longas noites

 

Devaneou com isolamentos

Nesta frente fria siberiana!

Divagou e choramingou neles

Sem troca de calor nenhuma

 

Confinados entre gases tóxicos

Pela estreitas ruas da atmosfera

Sem convecção nem livre dispersão

Ilhas de calor das cidades imensas

Nos outonos secos, nos invernos frios

Baixam, ameaçam trevas e névoas

Flutuando, mexidos por ventos fracos

À espera duma grande nuvem vertical

Que lhes libere desse pesado pesadelo

 

Viajou pelas subtis camadas de ar

Por adiabáticos impenetráveis

Ventos calmos, céu claro e longas noites

 

Sonhou que sonhava mas estava certo:

-Mulher de 48 anos cai abatida por um poluente agressor na manhã de hoje às 15:52. O lamentável sucesso …perde-se a voz do locutor da televisão digital terrestre no barulho do tráfego da manhã.

CRÓNICAS-ANA-CRÓNICAS

Minha Vida como um Cogumelo II parte

Hoje vi as flores violáceas da lavanda; as mais claras e resolutas do cebolinho; as da sálvia que há tão pouco plantei. Rebentando no alegrete: açucenas brancas

Hoje ontem e anteontem vi: tagarelar uns passarinhos bêbados; hibiscos amarelos; o tomilho que ´tava teso; coentro fresco, volúveis vermelhas em sangue acesas

Hoje vi o cão descarnado que se ralha; a garrafa de Sagres adormecida na areia; um gafanhoto monótono que espreita; formigas e formigas a toda a pressa

Hoje novamente como sempre por este escaninho omitido o tempo não passou, ou se passou…que pouco importou!

P.S

A cegonha passeia pela areia a comer o pão que todas as manhãs joga fora a velha. Cheira a peixe, a fogareiro, a maré, ao gasóleo do tractor, a sapal, a lama, a letargo. O helicóptero invasor espreita fita vigia ronda de manhã à noite ainda não sei o quê. Quando o vento é de terra às vezes cheira a merda

Deste modo chegou a primavera para uma tola solene que estava à espera.


Momento sensível e emotivo um dia de chuva numa aula qualquer

Imagen: Thinkstock

Terças e Quintas de 18:00 à 19:30

As terças e quintas sob um búzio
(Que é uma aula prefabricada)
De carteiras para pigmeus
As tardes de terças e quintas
Abandono-me sem remédio

Amo
No calor húmido dum liso inverno
O som longínquo da voz da Sêtora
Sobre o estrado  na clareira
do ano lectivo  dos mil e tantos
Em verão
Cochilam as cigarras da avenida

As terças e quintas são sagradas
De passos apressados no corredor
A canção de vocais diversas
(Indulgente) – “Calem… meninos …”
Burburinhos, abafadas conversas
Hora e meia a salvo de ciladas pois
Entre as empedradas ruas estreitas
Ando ainda espantada, sem inclusão
Na selva infinita de minha aldeia

Amo
Os sinos da chuva no tecto
Num reino de verbos evocantes
Rumor dos colegas a ler o exercício
Pureza do espaço detido
Por um bocado eterno e vago
Adjectivos precisos, exactos pronomes
E a precisa pronúncia. O sotaque
Só isso

Sussurros, os  risos nervosos
(a meia voz)“…Meninos faladores…”
No Convento Sem Lágrimas
Da Virgem do Conhecimento
A música celestial das Palavras
Sem mortos nem sofrimento

Amo
As tardes inúteis de terças e quintas
O silêncio das canecas ao escrever o ditado
O cheiro do giz que sempre me salva
O horizonte do quadro.

Assinado: A Cavala Assassina